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Emigrantes de chuteiras

<div style=’BACKGROUND: white’><span style=’FONT-SIZE: 10pt’><font face=’Verdana’>Entre os milh&otilde;es de brasileiros atualmente residem no exterior, h&aacute; cerca de 5 mil jogadores de futebol. Um estudo feito na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) tra&ccedil;ou o perfil dos emigrantes de chuteiras e constatou que eles vivem em condi&ccedil;&otilde;es t&atilde;o especiais que n&atilde;o chegam a ser considerados imigrantes nos pa&iacute;ses de destino.<br /><br /></font></span></div><div style=’BACKGROUND: white’><span style=’FONT-SIZE: 10pt’><font face=’Verdana’>A pesquisa, publicada na revista <em>Horizontes Antropol&oacute;gicos</em>, aponta ainda que os jogadores emigram cada vez mais jovens, normalmente s&atilde;o os ca&ccedil;ulas da fam&iacute;lia e, em grande parte, s&atilde;o evang&eacute;licos. A autora, Carmen Silvia Rial, &eacute; professora do Departamento de Antropologia da UFSC.<br /><br /></font></span></div><div style=’BACKGROUND: white’><span style=’FONT-SIZE: 10pt’><font face=’Verdana’>O ato de emigrar para jogar em clubes do exterior &ndash; ou &ldquo;rodar&rdquo;, na linguagem futebol&iacute;stica, &eacute; classificado como &ldquo;circula&ccedil;&atilde;o&rdquo; no estudo, j&aacute; que os jogadores est&atilde;o em outros pa&iacute;ses de passagem, de acordo com a antrop&oacute;loga. &ldquo;Eles n&atilde;o se consideram e n&atilde;o s&atilde;o considerados como imigrantes. Suas refer&ecirc;ncias de fronteiras simb&oacute;licas n&atilde;o s&atilde;o as nacionais ou locais, mas as dos clubes&rdquo;, disse Carmen &agrave; <strong>Ag&ecirc;ncia FAPESP</strong>.<br /><br /></font></span></div><div style=’BACKGROUND: white’><span style=’FONT-SIZE: 10pt’><font face=’Verdana’>Segundo ela, essa circula&ccedil;&atilde;o ocorre em circuitos particulares, que podem abranger diversos Estados-na&ccedil;&otilde;es, sem que suas fronteiras sejam especialmente relevantes. A primeira caracter&iacute;stica que se diferencia esse grupo dos emigrantes &eacute; o registro, mais preciso do que nos casos de emigra&ccedil;&atilde;o convencional.<br /><br /></font></span></div><div style=’BACKGROUND: white’><span style=’FONT-SIZE: 10pt’><font face=’Verdana’>&ldquo;N&atilde;o h&aacute; dados precisos sobre a emigra&ccedil;&atilde;o no Brasil, porque grande parte das pessoas sai sem declarar. No caso dos jogadores de futebol isso n&atilde;o ocorre. Todo esse fluxo &eacute; registrado. Embora esses jogadores venham, em grande parte, das camadas m&eacute;dias e subalternas, com perfil parecido dos emigrantes que normalmente saem do pa&iacute;s, eles n&atilde;o s&atilde;o vistos como imigrantes l&aacute; fora, mas contam com um estatuto especial&rdquo;, disse.<br /><br /></font></span></div><div style=’BACKGROUND: white’><span style=’FONT-SIZE: 10pt’><font face=’Verdana’>De acordo com Carmen, o perfil desses jogadores em nada se aproxima do imigrante que aparece na m&iacute;dia estrangeira &ndash; r&oacute;tulo geralmente impingido com teor pejorativo. Normalmente, segundo ela, o termo &eacute; empregado para designar os trabalhadores bra&ccedil;ais e &eacute; associado ao crime e &agrave; ilegalidade. &ldquo;Em reportagens sobre imigra&ccedil;&atilde;o, os jogadores s&atilde;o invis&iacute;veis nas mat&eacute;rias. Nem os pr&oacute;prios jogadores se identificam como imigrantes nos pa&iacute;ses onde est&atilde;o jogando&rdquo;, afirmou.<br /><br /></font></span></div><div style=’BACKGROUND: white’><span style=’FONT-SIZE: 10pt’><font face=’Verdana’>&ldquo;H&aacute; uma grande dist&acirc;ncia entre o estatuto do jogador de futebol e o que se considera imigrante nos pa&iacute;ses de destino, mas, por outro lado, h&aacute; uma proximidade com outros tipos de circula&ccedil;&atilde;o hoje no mundo. Intelectuais e estudantes que v&atilde;o fazer doutorado e p&oacute;s-doutorado no exterior n&atilde;o s&atilde;o vistos como imigrantes e eles tamb&eacute;m n&atilde;o se representam de modo&rdquo;, disse.<br /><br /></font></span></div><div style=’BACKGROUND: white’><span style=’FONT-SIZE: 10pt’><font face=’Verdana’>A id&eacute;ia de emigra&ccedil;&atilde;o hoje, afirma a pesquisadora, &ldquo;precisa ser repensada para incluir essas pessoas que circulam pelo planeta sem corresponder ao perfil daqueles que rompem v&iacute;nculos e refer&ecirc;ncias familiares e nacionais&rdquo;.<br /><br /></font></span></div><div style=’BACKGROUND: white’><span style=’FONT-SIZE: 10pt’><font face=’Verdana’>A pesquisa, iniciada em 2003, partiu da perspectiva dos jogadores brasileiros no exterior. Participaram cerca de 40 jogadores que viviam ou haviam vivido e exercido sua profiss&atilde;o no exterior &ndash; muitos deles em mais de dois pa&iacute;ses. De acordo com a pesquisadora, o estudo etnogr&aacute;fico se concentrou nas cidades de Sevilha (Espanha) e Eindhoven, na Holanda.<br /><br /></font></span></div><div style=’BACKGROUND: white’><span style=’FONT-SIZE: 10pt’><font face=’Verdana’>&ldquo;Tamb&eacute;m conversei com muitos de seus familiares, amigos, empres&aacute;rios, t&eacute;cnicos e secret&aacute;rios diversos, realizei entrevistas, assisti a treinos e a jogos, visitei seus restaurantes preferidos e algumas de suas casas no Canad&aacute;, Holanda, Jap&atilde;o e tamb&eacute;m no Brasil. E mantive longas conversas telef&ocirc;nicas com jogadores e seus familiares na Fran&ccedil;a, M&ocirc;naco e B&eacute;lgica&rdquo;, explica Carmen, que atualmente escreve um livro sobre o tema. <br /><br /><strong>Ca&ccedil;ulas e evang&eacute;licos<br /><br /></strong></font></span></div><div style=’BACKGROUND: white’><span style=’FONT-SIZE: 10pt’><font face=’Verdana’>O estudo aponta que cerca de 90% dos entrevistados que migraram s&atilde;o provenientes de camadas com menores faixas de renda. A maioria dos jogadores entrevistados tinha apenas o prim&aacute;rio, e uma parcela de cerca de 10% conseguiu terminar o secund&aacute;rio. Apenas duas entre as esposas conclu&iacute;ram o terceiro grau, mas segundo o estudo &ldquo;h&aacute; uma tend&ecirc;ncia de que as mulheres apresentem uma escolaridade maior do que a dos jogadores&rdquo;.<br /><br /></font></span></div><div style=’BACKGROUND: white’><span style=’FONT-SIZE: 10pt’><font face=’Verdana’>O perfil identifica ainda que os jogadores receberam apoio familiar e, em geral, s&atilde;o os ca&ccedil;ulas da casa. Um dado que chamou a aten&ccedil;&atilde;o, segundo Carmen, diz respeito &agrave; pr&aacute;tica religiosa. &ldquo;&Eacute; interessante como Deus &ndash; e n&atilde;o a religi&atilde;o &ndash; &eacute; um valor central na vida deles, em sua grande maioria, evang&eacute;licos.&rdquo;<br /><br /></font></span></div><div style=’BACKGROUND: white’><span style=’FONT-SIZE: 10pt’><font face=’Verdana’>De acordo com a pesquisadora, uma das hip&oacute;teses para explicar a centralidade da f&eacute; &eacute; que a situa&ccedil;&atilde;o de vida do jogador muda radicalmente em pouco tempo. &ldquo;Eles precisam de algum tipo de aux&iacute;lio externo que os ajude a elaborar esse tipo de situa&ccedil;&atilde;o, que d&ecirc;em alguma explica&ccedil;&atilde;o. Eles encontram na religi&atilde;o esse campo onde se sentem amparados&rdquo;, apontou.<br /><br /></font></span></div><div style=’BACKGROUND: white’><span style=’FONT-SIZE: 10pt’><font face=’Verdana’>Segundo o estudo, &eacute; no consumo cotidiano em que se percebe mais claramente a dimens&atilde;o da &ldquo;identidade nacional&rdquo; nesses jogadores. Os altos sal&aacute;rios recebidos pelos jogadores na Europa e no Jap&atilde;o n&atilde;o se refletem em consumos ostentat&oacute;rios. Seus h&aacute;bitos, afirma o artigo, &ldquo;aproximam-se mais os de uma camada m&eacute;dia-alta do que da faixa dos milion&aacute;rios, que s&atilde;o efetivamente. N&atilde;o transitam em avi&otilde;es particulares, n&atilde;o possuem iates, n&atilde;o passam as f&eacute;rias em ilhas particulares, nem freq&uuml;entam restaurantes de luxo.&rdquo;<br /><br /></font></span></div><div style=’BACKGROUND: white’><span style=’FONT-SIZE: 10pt’><font face=’Verdana’>&ldquo;Eles moram em casas espa&ccedil;osas localizadas em bairros nobres &ndash; geralmente os que concentram grande n&uacute;mero de jogadores de futebol &ndash;, mas n&atilde;o vi na decora&ccedil;&atilde;o das casas nenhuma grande extravag&acirc;ncia. Continuam a vestir-se como os jovens de sua idade, com t&ecirc;nis, jeans e camisetas, a comer em casa ou em restaurantes que sirvam comida pr&oacute;xima da brasileira&rdquo;, disse.<br /><br /></font></span></div><div style=’BACKGROUND: white’><span style=’FONT-SIZE: 10pt’><font face=’Verdana’>Os &uacute;nicos consumos de luxo recorrentes entre eles, acrescenta, s&atilde;o &ldquo;os autom&oacute;veis, sempre carros novos de luxo, mas &agrave;s vezes fornecidos pelo pr&oacute;prio clube, os brincos de diamantes ou as invari&aacute;veis <em>trousses de toilette</em> Louis Vuitton&rdquo;.<br /><br /></font></span></div><div style=’BACKGROUND: white’><span style=’FONT-SIZE: 10pt’><font face=’Verdana’>A autora diz que, ao contr&aacute;rio do que se v&ecirc; um pouco na m&iacute;dia ou do que torcedores brasileiros imaginam, esses jogadores n&atilde;o se europeizaram. &ldquo;Eles continuam sendo muito nacionalistas, tendo o Brasil como principal refer&ecirc;ncia, e no seu cotidiano o pa&iacute;s &eacute; extremamente presente&rdquo;.<br /><br /></font></span></div><div style=’BACKGROUND: white’><span style=’FONT-SIZE: 10pt’><font face=’Verdana’>A pesquisadora destaca a efemeridade de suas perman&ecirc;ncias nas institui&ccedil;&otilde;es de trabalho e nos pa&iacute;ses no exterior e caracteriza essa emigra&ccedil;&atilde;o como uma &ldquo;circula&ccedil;&atilde;o&rdquo;, que poderia ser chave explicativa para a manuten&ccedil;&atilde;o desse sentimento nacional. Segundo ela, o estudo ter&aacute; continuidade. Mas com outro foco.<br /><br /></font></span></div><div style=’BACKGROUND: white’><span style=’FONT-SIZE: 10pt’><font face=’Verdana’>&ldquo;Trabalhei muito com celebridades, com jogadores que tiveram carreiras de sucesso no exterior em clubes globais, e menos com os desconhecidos, que est&atilde;o em outra faixa salarial. Quero agora focar nesse grupo que est&aacute; no exterior, mas que n&atilde;o tem a mesma trajet&oacute;ria de sucesso, an&ocirc;nimos para n&oacute;s brasileiros, que est&atilde;o em clubes menores e perif&eacute;ricos. E tamb&eacute;m focar nos que j&aacute; retornaram&rdquo;, disse.<br /><br /></font></span></div><div style=’BACKGROUND: white’><span style=’FONT-SIZE: 10pt’><font face=’Verdana’>Para ler o artigo <em>Rodar: a circula&ccedil;&atilde;o dos jogadores de futebol brasileiros no exterior </em>, de Carmen Silvia Rial, dispon&iacute;vel na biblioteca on-line SciELO (Bireme/FAPESP).&nbsp;</font><a href=’http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&amp;pid=S0104-71832008000200002&amp;lng=pt&amp;nrm=iso&amp;tlng=pt’><font face=’Verdana’>http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&amp;pid=S0104-71832008000200002&amp;lng=pt&amp;nrm=iso&amp;tlng=pt</font></a><br /><br /></span></div><div><font face=’Verdana’ size=’2′>Por Alex Sander Alc&acirc;ntara</font></div><div><font face=’Verdana’ size=’2′>Ag&ecirc;ncia Fapesp, 03/11/2008</font></div>

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