Clubes não oferecem assistência adequada aos atletas
A carreira de jogador de futebol já é curta, em comparação com as profissões mais convencionais. E tem uma peculiaridade: Sua vocação, para muitos a única em suas vidas, depende de seus corpos. E quando eles já não respondem às necessidades do dia-a-dia, obrigando o atleta a encerrar a carreira prematuramente? Exemplos como os de Filipe Alvim, Fabrício de Carvalho e Bebeto Campos e Leandro, obrigados a parar de jogar por problemas cardíacos, estão cada vez mais vindo à tona no Brasil.
Na maioria das vezes, o jogador fica à mercê da boa vontade do clube ou de algum médico para não sucumbir ao abandono. "Tenho visto muitos casos assim no futebol. Depois que os jogadores têm de parar, em geral, são largados pelos clubes, ficam perdidos, alguns viram camelôs", atesta o médico Nabil Ghorayeb, chefe da Seção Médica de Cardiologia do Esporte e do Exercício do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, que freqüentemente tem de cuidar de casos de atletas forçados a parar.
O drama de Fabrício Carvalho
O atacante Fabrício Carvalho, do São Caetano, é um que luta para não cair nessa situação. Obrigado a interromper a carreira no ano passado, também por problemas no coração, vem sendo monitorado por médicos do HCor, onde Ghorayeb também atua.
Na semana que vem deverá saber como será sua reabilitação. A situação ainda exige cautela, apesar de ele ter melhorado. Enquanto isso, o jogador, que é evangélico, toca violão em um grupo gospel e freqüenta os cultos para manter a fé.
A evolução positiva de seu quadro pode ter sido fruto da falta de atividade. Fabrício engordou cerca de 10 quilos. "Se tivesse continuado na situação que estava, ele seria obrigado a encerrar a carreira. Houve uma melhora em relação àquela situação, mas precisamos testá-lo dentro de um programa de reabilitação cardíaca para ver se a melhora é efetiva e se não poderá haver retrocesso", disse Ghorayeb.
Perigo de abandono
O São Caetano tem arcado com todos os custos do tratamento, além de pagar em dia os salários do jogador. Mas isso vai durar apenas até o fim de seu contrato com o clube, a ser encerrado daqui a cerca de um ano. Caso o jogador tenha de parar depois desse período não irá receber nenhum auxílio. "Garantimos total cobertura ao Fabrício até que se encerre seu contrato com o clube. Primeiro estamos pensando que ele irá voltar a jogar. Depois é outra história", disse o diretor de futebol do São Caetano, Genivaldo Leal.
Seu argumento se encaixa ao da maioria dos clubes. "Se você encerrar seu contrato com a empresa que trabalha porque teria de ficar recebendo dela depois?", perguntou, em tom de ironia.
A situação torna-se complexa porque não há uma legislação específica sobre a aposentadoria dos jogadores de futebol. Os seguros para esses casos são muito caros. Somente os de uma elite futebolística poderiam pagá-los. Os clubes não costumam arcar com esses custos.
Aposentadoria especial
Nos Estados Unidos, todo jogador de futebol americano, um esporte que aposenta muitos atletas precocemente, tem um seguro feito por ele ou pelo clube. Mas lá as cifras são muito mais altas e há condições financeiras para a contratação desse serviço. É comum por exemplo um atleta americano receber US$ 100 milhões por 10 temporadas, mesmo em uma equipe de médio ou pequeno porte.
Segundo o diretor do Sindicato dos Atletas Profissionais do Estado de São Paulo, Luís Eduardo Pinella, a entidade vem discutindo formas para se adaptar a aposentadoria do INSS ao futebol. "É uma questão complicada. Quando o jogador é obrigado a parar, quem disse que se trata de aposentadoria?", observa.
Pinella, que já foi zagueiro do Corinthians, afirma que o jogador fica na maioria das vezes sem a aposentadoria. "Pode-se argumentar que ele tem condições de trabalhar atrás de uma escrivaninha, por exemplo. De que forma o INSS vai reconhecer, se considerar esta uma invalidez parcial? Buscamos criar uma aposentadoria especial para o jogador, com um período menor para a aposentadoria e uma contribuição maior, pois mesmo se ele seguir até o fim da carreira, seu período de trabalho é curto", diz o dirigente.
Por Eugenio Goussinsky (www.cidadedofutebol)