Candidato a craque cai na promessa de empresário e está há 20 dias no saguão do aeroporto de Frankfurt
Era para ser a história de mais um talento do futebol brasileiro desabrochando no exterior, mas virou pesadelo para a família do técnico da Companhia de Processamento de Dados do Município de São Paulo (Prodam) Paulo Roberto Rodrigues. O filho dele, Douglas dos Santos Rodrigues, de 20 anos, viajou para a Europa com a promessa de jogar num bom time, mas está há cerca de 20 dias vivendo no saguão do aeroporto internacional de Frankfurt, na Alemanha. Outros cinco jogadores brasileiros com idade ente 18 e 21 anos estão na mesma situação.
"Estou muito preocupado. O moleque está vivendo numa situação precária no aeroporto. Quero meu filho de volta", desabafou Rodrigues. "O visto dele venceu dia 13 de fevereiro. Ele pode ser preso se ficar circulando. A gente pensava que o clube europeu renovaria o documento", explicou o pai. Rodrigues disse que o filho não tem mais a passagem de volta para o Brasil e que ele não tem dinheiro para comprar outra.
O combinado com o empresário que contatou o grupo, Wilson Bellissi Jr., era que os jovens, atletas amadores, seriam recebidos num time na Romênia. Acompanhado de um homem que se apresentou como Tetris Bellissi, irmão de Wilson, os jogadores deixaram o Brasil no início de fevereiro. Foram informados, na escala na Alemanha, que iriam jogar num time na Moldávia, outro país do leste europeu. "Quando chegamos na Moldávia, não tinha nada certo. Ninguém sabia que a gente estava indo pra lá. Ficamos dois dias num quartinho", relatou Douglas ao Estado, ontem, por telefone. "De lá, voltamos para a Alemanha porque o empresário disse para o irmão dele, que está com a gente, que viria para cá no outro dia para levar a gente para Barcelona (Espanha)."
Douglas e a família desconfiam que foram enganados. Bellissi Jr., que não viajou para Europa, disse que houve um desencontro. "Eles iam para a Romênia num time chamado Otelu. Mas esse time colocaria os jogadores num time da Moldávia chamado Zimbro. Eles têm parceria", afirmou. Segundo o empresário, eles chegaram à Moldávia dois dias após o combinado, a "alfândega estava fechada" e o time havia ido passar a pré-temporada em Barcelona, na Espanha. Então, segundo Bellissi Jr., eles voltaram para Frankfurt para tentar viabilizar a ida a Barcelona. Após falar com a reportagem do Estado, o empresário fez contato com o irmão para tirar os jovens do aeroporto.
Douglas disse que quer voltar, mas os outros meninos não. "Eles ainda estão sonhando", afirmou. A dona de casa Maria do Rosário Messias, mãe de Diego, de 20 anos, disse que o filho liga todo dia para dar notícias e está tranqüilo. "Eles estão com problemas no aeroporto, mas não sei se caíram num golpe", relatou. "Meu filho disse que está com a passagem dele e que vai esperar até quinta-feira para ver se volta para o Brasil ou não."
Ontem à noite (horário do Brasil), Diego disse à mãe que o irmão do empresário os levaria para um apartamento, mas não passou o endereço. "Dei ordem para o Douglas ficar no aeroporto. Não quero mais ele com essa gente", afirmou Rodrigues.
A pedido da família, o advogado Pedro Lazarini Neto enviou ontem ao Consulado do Brasil em Frankfurt solicitação de "assistência consular" para os garotos. No documento, em que pediu "providências urgentes", Lazarini sustentou que, quando chegaram à Europa, os rapazes "verificaram não haver nenhum contrato (com time de futebol), nem contato estabelecido". Agora, Rodrigues não quer mais sonhar. Só quer o filho ao seu lado, em segurança.
Jogadores brasileiros vivem situação parecida à do personagem de Tom Hanks em ‘Terminal’
"Fiquei quase 20 dias sem tomar banho", disse Douglas dos Santos Rodrigues, que está desde o início de fevereiro vivendo no aeroporto internacional de Frankfurt, na Alemanha, numa situação semelhante à que o personagem de Tom Hanks viveu no filme "Terminal". "Só consegui tomar ontem porque um português que trabalha aqui liberou uma ducha para a gente. Banho aqui custa 6 euros." As refeições têm se resumido a lanches e o contato com a família é feito pelos computadores e telefones do setor de informação do aeroporto. "Estou me sentindo meio mal, largado. Estamos dormindo num banco muito duro."
O pai dele, Paulo Roberto Rodrigues, desembolsou quase R$ 6 mil para a viagem do filho. Vendeu carro e tudo. "Só de passagem, gastei R$ 3.600. Teve mais passaporte, visto e outras coisas. Para conseguir o registro profissional dele, o empresário me cobrou R$ 1.500,00 e não deu nenhum documento para provar", declarou. Rodrigues é funcionário público e ganha cerca de R$ 2 mil, segundo o filho Jefferson.
A mãe de Raphael Correia Luz, de 18 anos, não sabia exatamente o que o filho estava passando. "Ele me disse que dorme em um apartamento", relatou Solimar. Ontem, o rapaz disse ao Estado, por email, que "não está como se eu estivesse em casa, mas o mundo da bola é assim mesmo". "Iremos para um apartamento hoje à noite. Já conversei com a minha mãe", completou Raphael.
Douglas conheceu o empresário Wilson Bellissi Jr. em novembro de 2005, na Federação Paulista de Futebol, quando foi assinar um documento de liberação do passe. "Meu irmão joga bola há muito tempo. Já passou pelo Corínthians (pelo campeonato interno) e pelo Nacional. Nesse dia, o empresário se ofereceu para prestar assistência", disse Jefferson, irmão do atleta. A primeira proposta foi para jogar no Brasiliense. "Daí começou uma enrolação. Disseram que não tinha vaga para ele e, um mês depois, começou essa história de Romênia." Jefferson não se conforma de não ter desconfiado. "O cara até freqüentou nossa casa."
Por Laura Diniz
O Estado de S. Paulo (22/02/2006)