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Caso Palmeiras: da aplicação do direito a uma questão de educação

PALAVRA DO PRESIDENTE

Essa semana, o pedido de impugnação da partida entre SE Palmeiras e SC Internacional será apreciado, e reputo ser um bom momento para uma reflexão. Seja na imprensa “especializada”, seja em discussões jurídicas de debate virtual, seja em rodas de amigos nos mais variados ambientes ou até mesmo nos  gabinetes de políticos e magistrados, muitos têm lido e ouvido a respeito da polêmica que vem envolvendo este pedido de impugnação de partida que a SE Palmeiras fez por ter tido um gol invalidado contra o SC Internacional de Porto Alegre.

Frases como “o time é muito ruim, deve mesmo ser rebaixado, e não pode pedir a impugnação da partida”, ou “ o gol foi de mão e seria uma vergonha validá-lo”, ou também “o STJD é um tribunal de brincadeira e só faltava, agora, validar um gol de mão”, foram algumas manifestações que se pôde ter contato. Manifestações deste tipo mostram duas facetas do brasileiro: o desrespeito oriundo da falta de educação e o fanatismo exacerbado.

Trabalhos científicos já mostraram que o fanatismo tem relação direta com a ignorância, sendo que esta, por sua vez, é decorrência direta do problema de educação básica – e cultura – que temos em nosso país. O fanatismo faz com que as pessoas não tolerem, não admitam qualquer diferença. Qualquer pessoa que acredite, viva, pense ou aja de forma diferente da do fanático é inimigo, portanto, deve “morrer”.

Vê-se a ignorância proliferando dia a dia. Talvez, se tivéssemos trabalhado melhor  a educação em nosso país, não precisaríamos de leis para garantir cotas para negros nas universidades, tampouco lei que criminalize a homofobia.

E o futebol, provavelmente, seja o segmento onde mais temos que conviver com os fanáticos que desrespeitam tudo e a todos, infelizmente. Porém, a discussão, no que diz respeito à postura da SE Palmeiras, deve ir noutro sentido e muito mais além. Não importa se o clube está em vias de rebaixamento. A discussão seria a mesma, caso já fosse campeão antecipado ou se tivesse numa posição da tabela em que a perda dos pontos não lhe afetasse.

Há muito tempo que vimos discutindo a interferência da tecnologia televisiva para melhorar a aplicação das regras do jogo, no futebol , auxiliando o árbitro em sua dificílima tarefa, todavia tal questão vem sendo, veementemente, repelida pela FIFA, entidade máxima do futebol, que somente aceitou, recentemente, a ajuda da tecnologia para saber se a bola ultrapassa ou não a linha do gol. Tão recentemente, que não foi ainda implantada. E o fez por pressões exercidas à exaustão, na Europa, pelo gol não dado à Inglaterra contra a Alemanha, na Copa de 2010, que gerou uma estridente polêmica no velho continente. E só por isso. Se não houvesse acontecido tal fato, nada teria mudado, e não haveria nem essa aceitação que, convenhamos, é muito tímida.

Nós, do Sapesp, apoiamos o uso das imagens da TV por termos certeza de que evitaria – para dizer o mínimo –  muitas injustiças. Com auxílio do árbitro-advogado Sálvio Spindola, membro da Comissão de Direito Desportivo da OAB-SP, foi projetada uma partida de futebol, onde desfilaram atletas de São Paulo e Rio de Janeiro, que mostrou que o uso da tecnologia televisiva pode sim ser muito útil, porém, ainda sem sensibilizar a dona do futebol, a FIFA. Então, fica claro que não pode o uso de tecnologia televisiva para interferir na aplicação das regras do jogo. Não pode.

Quanto à discussão do pedido de impugnação feito pela SE Palmeiras, a discussão deve começar e terminar por aí, na aplicação da norma legal, nesse caso, a norma desportiva. Lógico que toda norma legal pode ser interpretada de formas distintas, e aí se baseia na beleza do direito. Com base em uma norma, convencer, dentro dos parâmetros lícitos, aquele que pode aplicá-la. Um interessante jogo de estratégias.

Houve ou não o uso da tecnologia para invalidar o gol da SE Palmeiras? Vejamos as questões pertinentes ao caso, começando pelo  árbitro: a regra 5 do futebol, entre outras coisas, prevê que “o árbitro somente poderá modificar uma decisão, se perceber que a mesma é incorreta ou, a seu critério, conforme a indicação de um árbitro assistente ou do quarto árbitro, sempre que ainda não tiver reiniciado ou terminado o jogo ”.E como vimos, o árbitro principal validou o gol. Participavam diretamente da jogada ele, o árbitro assistente e o assistente de linha de fundo, ou seja, todos os responsáveis diretamente envolvidos naquele lance e nada viram de anormal. Tampouco o árbitro assistente que corre, ou trabalha, na linha oposta. Depois de seis minutos o árbitro principal anulou o gol com o auxílio do quarto árbitro, porém, a polêmica se baseia nesse ponto.

A SE Palmeiras alega que o quarto árbitro somente mudou seu posicionamento depois de ouvir, de um repórter de campo, que o gol fora feito com o uso da mão do atacante palmeirense Barcos. E de fato é clara a situação. Os três árbitros, que participaram diretamente do lance, validaram o gol, e quando se revê o lance, pela TV, temos essa convicção, com tranquilidade. E somente depois de alguns minutos vem a notícia do toque de mão pelo quarto arbitro. Aqui, um parênteses: é muita covardia esses comentaristas de arbitragens, depois de analisarem o lance várias vezes, atestarem que o árbitro errou. Todos eles, quando atuavam como árbitros, erravam e muito, como qualquer outro, só que não havia tantas câmeras para julgá-los. E agora posam de maiorais. Pois é, eles não se envergonham, todavia eu me envergonho por eles.

Pois bem, neste episódio, como já mencionado, há que se restringir a discussão ao fato de ter havido o uso das imagens da TV ou não. E não há nada de imoral ou vergonhoso no pedido da SE Palmeiras. Somente o exercício de um direito constitucional, que todos os cidadãos têm de buscar, no judiciário, um direito quando se julgue lesado nele.

Sigamos no raciocínio, porém, invertendo o caminho. O pedido para a impugnação de uma partida pode acontecer até 24 horas após o término da mesma. Então, cabe a questão: pode um clube requerer a impugnação da partida, caso o árbitro tenha validado um lance, em que se pode constatar, mais tarde, na TV, que estava em desacordo com as regras do jogo? A resposta é não.

E da mesma forma como ocorreu na partida entre SE Palmeiras e SC Internacional, iriam utilizar das imagens de vídeo, ou TV como queiram, para interferir na aplicação da regra do jogo. Então, se não pode utilizar depois, dentro do prazo permitido, também não pode utilizar enquanto a partida transcorre. Não pode lá, não pode cá. Não há como aplicar a mesma norma de forma diferente, ela vale para todos – outro princípio constitucional. Muito simples. Agora, não dá para querer tapar o sol com a peneira. A SE palmeiras terá problemas. E quais seriam os problemas então?

O primeiro grande problema será provar o alegado. Leu-se que um repórter, que teria vivenciado o fato, viu quando o quarto árbitro recebeu a informação do toque de mão. Se não vivenciou, fora ele mesmo que passara a informação e estaria disposto a depor para comprovar o acontecido. Problema dos grandes. E por que problema dos grandes? Porque já houve caso em que pedimos a seis repórteres, que estavam na portaria de um clube, que depusessem atestando que um jogador havia sido impedido de entrar para treinar (o que caracterizaria rompimento de contrato por justa causa por parte do clube ), já que os seis estavam presentes no momento do ocorrido, e depois de um primeiro contato, quando disseram que testemunhariam a favor do futebolista, simplesmente recuaram e mudaram de atitude. Alegaram os mais variados motivos, desde pressão do clube até o fato de dois deles estarem em início de carreira e que tal manifestação poderia prejudicá-los.

Como já mencionado aqui, questões de cidadania e politização são graves problemas decorrentes da nossa falta de educação.

Quando não se tem educação, não há a visão de que não fazer valer o direito do próximo é não fazer valer seu próprio direito. Então, tem-se que a comprovação do fato, não é um simples problema, mas um problema crucial.E se a SE Palmeiras fizer a prova? Aí surge o segundo grande problema. Os auditores do STJD, que são os juízes do caso, invariavelmente, também podem compor a lista daqueles que são apaixonados pelo futebol com problemas de educação e que podem, simplesmente, não dar o direito que se comprovou.Nesse caso, poderia surgir até uma indignação geral: mas como uma pessoa que se propõe a analisar e julgar questões importantes pode se deixar levar pela paixão e sedução exercidas pelo futebol?  Infelizmente acontece. Acontece até com muitos magistrados que se apaixonam e se deixam seduzir pelo futebol e, ao julgar litígios trabalhistas, o fazem sem nenhum escrúpulo, influenciando e prejudicando decisivamente a vida de um cidadão. Faz valer  o amor pelo clube, não o direito do trabalhador.

Aí, outra séria questão na educação de nosso país: não é porque a pessoa conseguiu virar magistrado que não tenha problema de educação. Ele não está acima do bem e do mal. E essa conduta – a de julgar com a paixão inescrupulosa –  torna-se ainda pior, porque quando essa figura atua, o faz em nome do Estado brasileiro.

Portanto, o que se dirá da postura de alguns auditores do STJD, numa matéria que é infinitamente menos importante do que subsistência do trabalhador?O clube paulista pode comprovar sim, mas em vão.No entanto, se a SE Palmeiras comprovar o fato e não tiver seu direito reconhecido, pelos motivos já expostos, abre-se um precedente perigosíssimo no cenário futebolístico nacional.Por isso, e apesar de meu sentimento de ceticismo, penso que os auditores seriam “obrigados” a reconhecer que houve interferência externa, que tal condição não é possível, e que a partida deve ser novamente realizada.

Quanto à impugnação da partida, a palavra está com o STJD. Quanto à educação… coitada da nossa educação!
 
Rinaldo Martorelli
Presidente do Sapesp
Pós-graduado em Direito Desportivo
Mestre em Direito
Vice-presidente da Comissão de Direito Desportivo da OAB/SP

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